Quem nunca se vangloriou por pagar menos de 20 reais em uma camiseta? Ou quem nunca acabou comprando uma roupa que não precisava só porque ela parecia barata demais?
O baixo preço é um dos principais atrativos do fast fashion, modo de produção tradicional de roupas em larga escala no qual as peças são fabricadas, consumidas e descartadas em pouquíssimo tempo.
Esse modelo, no entanto, existe às custas de exploração de trabalho, de recursos naturais e da degradação do meio ambiente e, por isso, tem sido bastante questionado por ativistas e por profissionais do mundo da moda.
É o caso da estilista Carolina Nogara, que fabrica roupas no modelo slow fashion, um conceito que nasceu em reação ao fast fashion, ao consumismo no hábito de vestir, e que prioriza o trabalho artesanal, a sustentabilidade e as criações personalizadas na produção das roupas.
Proprietária da Nogara Fashion Design, a curitibana começou a confeccionar roupas em 2011, quando abriu sua primeira loja, que usava sobras e retalhos como matéria prima.
“Aprendi a costurar muito pequena, brincando com retalhos nos ateliês da minha mãe. Sempre me encantaram aqueles pedaços de tecidos lindos, que eu usava para fazer roupas de boneca, e me revoltava a ideia de que essas preciosidades seriam jogados fora como lixo no fim do dia”, relembra a estilista.
Anos depois, as roupas de bonecas deram lugar à peças reais, como as de sua última coleção nomeada ROMA, que foi toda feita com reaproveitamento de tecidos e modelada sob medida, convidando diferentes clientes para participar ativamente da criação das roupas.

Foto: Allan Kanashiro
Fabricação e impacto nos preços na moda slow fashion
Carolina explica que, como slow fashion significa moda consciente, a fabricação de peças nesse modelo deve considerar o ciclo de vida dos produtos, estendendo-o ao máximo possível e fazendo o necessário para viabilizar seu reaproveitamento, com mínimo impacto para o meio ambiente.
Para isso, é preciso rastrear a origem dos insumos e buscar produzir peças duráveis. Ao adotar medidas de produção consciente, no entanto, os custos necessariamente aumentam, já que essas “externalidades” – como a qualidade do ar e da água, a disponibilidade de recursos naturais, a remuneração justa dos trabalhadores em toda a cadeia de produção
– passam a ser incorporadas.
No conceito slow fashion, os custos indiretos vêm sendo incorporados aos poucos ao preço dos produtos finais, conforme a consciência sobre seu valor. Do ponto de vista do consumidor, contudo, o maior custo de uma peça de qualidade se dilui ao longo de sua vida útil.
A estilista, então, questiona: colocando na balança, o que é mais caro: uma camiseta de viscose mal acabada que dura seis meses, ou uma camisa de linho ou cânhamo que pode resistir por 15 anos ou mais?

Foto: Allan Kanashiro
Slow movement e o consumo consciente
A preocupação com o planeta e a sustentabilidade, felizmente, são temas em alta. Assim como o slow food (conceito que se originou na Itália nos anos 1990) prega uma maior atenção ao alimento que ingerimos, à sua origem, modo de preparo, facilidade de digestão e poder nutritivo, o slow fashion também busca despertar consciência social para o sentido do vestir.
Traduzido como “moda devagar”, o conceito questiona os impactos da indústria da moda, que já não podem ser ignorados. Carolina explica que o modelo de produção que hoje predomina na indústria têxtil – o fast fashion – não é sustentável.
“Ele se baseia na exploração de mão-de-obra barata para produzir itens de rápido consumo em grande escala, com pouca ou nenhuma preocupação com a degradação ambiental, seja ela decorrente da extração de matérias-primas em velocidade maior que sua capacidade de regeneração, seja da produção massiva de resíduos plásticos que têm os aterros e oceanos como destino”.
A “moda devagar” busca frear essa máquina de destruição em massa por meio de uma tomada de consciência, tanto de quem produz, quanto de quem consome.
“Apenas a pressão dos consumidores sobre os governos e sobre as empresas fará com que a indústria repense suas práticas e passe a considerar os impactos indiretos de sua busca cega por lucro” afirma a estilista.
O Slow Movement é um movimento que propõe uma mudança cultural para a desaceleração da vida cotidiana e, no mundo da moda, isso significa adotar uma atitude mais consciente na hora de se vestir.
Isso porque o consumidor é peça fundamental para que haja uma mudança, já que a compulsão de compra pode alimentar o ciclo vicioso de degradação dos recursos naturais e desvalorização dos trabalhadores na indústria da moda, além de afastar quem consome de uma moda consciente.

Foto: Allan Kanashiro
O olhar crítico e libertador sobre o vestir
A estilista curitibana acredita que vivemos uma fase de transição na indústria e no consumo de moda, em escala global. Graças a internet, é possível beber de uma fonte inesgotável de imagens e conceitos de moda de todos os lugares, não apenas vindos de grandes marcas, mas de qualquer pessoa, por meio das redes sociais e magazines digitais autorais, por exemplo.
“É uma época de paradoxos: se por um lado nunca fomos tão consumistas, por outro nunca nos sentimos tão livres para experimentar e criar na hora de vestir. Com tantas referências à nossa volta, somos convidados ou mesmo provocados a conhecer mais, a ousar mais, e a desenvolver um olhar mais crítico e libertador na hora de se vestir”, comenta a estilista.
Carolina Nogara ainda ressalta que isso pode resultar em uma reconciliação com o próprio armário e, por fim, com nós mesmos. Ao aderir ao slow fashion e optar por um consumo consciente, vestir-se passa a ser um exercício de expressão da personalidade singular e vira também um processo de autoconhecimento, que beneficia o próprio consumir e também o planeta como um todo.